O século desvairado julga o Crucificado, um Deus flagelado, coroado de espinhos, ensangüentado, ferido, coberto de ignomínia, um símbolo absurdo de triste, de sofrimento e de dor, o cumulo da loucura.
Entretanto
a cruz é o sinal que se encontra nos lares bem formados, nas torres das
igrejas, nos túmulos cristãos. A cruz é o alivio dos desventurados e a
esperança dos moribundos. A cruz enternece na alegria, consola no abatimento, é
penhor de vida na sombra da morte. O mundo não entende a loucura da cruz de que
fala o Apostolo São Paulo.
-
“Nos stulti propter Christum”: “Somos loucos de amor por Cristo”.
Humilhar-se,
abater-se, perdoar, renunciar aos gozos, repudiar a avareza, a ambição, a
gloria, o furor do bem-estar, eis a loucura da cruz!
A
sacrossanta cruz reitera todas as imolações do Homem-Deus, desde o primeiro
vagido do presépio até o derradeiro gemido do Calvário, imolações essas
espontâneas, conforme predisse o profeta:
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“Oblatus est quia ipse voluit:” “Voluntariamente Jesus se sacrificou”.
A
cruz é obra estupenda de Deus. É o pólo de toda criação. É a síntese do amor
para quem algumas horas são longos anos! É a santa impaciência do amor!
O
mundo sem a bendita cruz seria insuportável; a vida, sem esperança; as
desgraças, sem consolação.
Na
cruz, o amor é sua própria vítima, seu próprio altar, seu próprio pontífice. Na
cruz está a gloria da matéria, a apoteose da castidade. Porque a Justiça divina
viu no Crucificado a responsabilidade da pena, mas não a malicia da falta.
A
humanidade, tão inclinada pela prevaricação adâmica aos furores da impureza e
as orgias da concupiscência, precisa do salutar remédio da santa cruz.
Porquanto,
o povo que não presa a cruz, que zomba do Crucificado, é um povo morto, perderá
sua liberdade, como aconteceu com o antigo império romano: Roma come, bebe,
diverte-se e morre!
Não
se encontra o Redentor senão com a cruz.
Por
conseguinte, todos a quem não satisfaz a realidade presente; todos que tem um
ideal; todos que possuem fome e sede de justiça deverão amar o sinal da nossa
salvação.
Não
se pode amar o divino Libertador sem amar também a sua cruz. Muitos querem o
reino celestial, mas não querem ir para lá pelo caminho da cruz.
Muitos
querem as consolações de Nosso Senhor, mas detestam seus trabalhos, suas
fadigas, seus padecimentos.
Muitos
desejam o doce e belo Tabor, mas aborrecem o espinhoso e acerbo Calvário.
Muitos almejam ser companheiros de suas alegrias, mas poucos preferem
compartilhar de suas amarguras.
Ninguém
quer a cruz de Cristo ou, se a deseja, há de ser conforme a seus gostos, a seus
caprichos, a suas inclinações, talha a seu bel-prazer.
Todavia
ninguém poderá viver sem cruzes. E face da universalidade da cruz, há somente
um dilema. Ou carregá-la com paciência e resignação e ser amigo de Jesus, ou
detestá-la e ser inimigo de Jesus conforme Ele mesmo afirmou:
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“Quem não está comigo, será contra mim!”
Não
há outro escape!
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Fonte: Ao entardecer, São Paulo: Edições Paulinas, 1957, p. 178-180.
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