GUSTAVO CORÇÃO
(17 de dezembro de 1896 – 6 de julho de 1978)
Uma
desordem total invadiu o nosso século. Em proporções gigantescas e com
indomável força ela, dia a dia, conquista os núcleos básicos da comunidade
humana.
A
característica principal da forma moderna da desordem é a inversão dos valores
do convívio humano, que começa cortando os laços que ligam os diversos escalões
da hierarquia social e termina no desentendimento total dos homens.
Na
família, os filhos estão surdos para o timbre da voz paterna. Os pais
estupefatos temem os filhos. Temem principalmente perdê-los. Com cabisbaixa
fraqueza cedem às suas imposições, para não perderem aqueles que de há muito
perderam. Congrega-os o lar apenas por laços de um certo instinto gregário e os
interesses monetários dos filhos. Mas o filho já é um estranho na casa.
Na
escola, a professora condicionada por uma pedagogia que nega a tendência da
criança para o mal (tendência que é um claro indício do pecado original) e o
valor educativo das punições, docilmente cede a todos os caprichos infantis.
Nos
ginásios, os adolescentes agrupados na promiscuidade da co-educação, iniciam-se
nas “viagens do fumo” e dos tóxicos, preparam-se para o amor nas “inocentes”
práticas sexuais, sob os olhares estimulantes e compreensivos dos orientadores
educacionais.
Nas
universidades, os representantes do mais tolo mito do século, o mito do JOVEM,
elaboram os programas, impõem e depõem os mestres e dirigentes, sob o pastoral
treinamento, nas universidades católicas, de sacerdotes mais imaturos que eles
e que os orientam conforme a moral permissiva e a linha subversiva.
As
nações, na desarvorada corrida para a tirânica democratização, já atingiram, ou
estão prestes a atingir, o mais que perfeito regime da desordem
institucionalizada de um Chile, de um Argentina ou dos ensaios brasileiros
pré-64.
Entre
os católicos o vírus do desconcerto infiltrou-se em proporções alarmantes. Os
detentores do poder sagrado, por pusilanimidade, por irresponsabilidade, por
comodidade, por estupidez, ou, o que é mais provável, por tudo isso junto,
entregaram de mãos beijadas o governo às conferências episcopais, às comissões
de peritos, que funcionam como imensas máquinas manipuladas pelos técnicos da
pastoral. Um poder invisível, onipresente e onipotente, age como um rolo
compressor, esmagando o doce e paterno cuidado dos pastores. Estes, submissos e
silenciosos, no clima asfixiantes dos diálogos, assinam tudo o que os
secretários das linhas pastorais 1, 2, 3, etc. lhes enviam para que livremente
não deixem de aprovar. O resultado do funcionamento dessa burocracia
eclesiástica é, além das estatísticas e das verbas astronômicas dispendidas, a
orientação para uma vida cristã onde em moral vale tudo e, em doutrina, nada
vale a verdade transmitida há dois mil anos.
O
princípio norteador da Grande Revolução é a quebra da ordem pela destruição da
hierarquia, da imagem do pai, do sacerdote e do príncipe.
A
subordinação livre e consciente do homem ao homem na família, na cidade e na
religião, força propulsora da ordem e da paz, é uma continuação da subordinação
ao Criador, ao Pai Eterno. Se tudo no Universo a Deus se subordina e a Ele se
relaciona como ao Criador, desde as suas origens a criatura humana a Deus se
liga como ao Pai. Porque Deus concedeu ao homem algo do seu próprio ser, da sua
própria vida: a inteligência, pela qual penetra no mistério da essência das
coisas; a graça, num plano mais alto, que permite ao homem pela fé, nesta vida,
e pela visão, na outra, perscrutar as profundezas de Deus.
Deus
é Pai porque gerando o homem pelo sêmen da graça fá-lo ser de um modo ainda
mais pleno a sua imagem e semelhança. O nome que mais convém a Deus, enquanto
fonte dessa vida divina em nós, é o de Pai. Pai que está sempre a nos lembrar
as nossas humildes origens do nada e as nossas grandiosas origens no amor e na
misericórdia divina; a nossa dependência, a nossa fraqueza.
Em
piedoso reconhecimento dessa paternidade divina, que nos tirou do nada para o
ser, de criatura, para filhos de Deus, na qual se encontra o sentido último de
toda autoridade humana, exclama S. Paulo: “Eu dobro os meus joelhos diante do
Pai, do qual toda paternidade no céu e na terra tira o seu nome”. (Ef., 3, 14).
A
Grande Desordem que contemplamos, consequência natural da Grande Revolução que
o “inimigo do homem” declarou contra o Filho do Homem nos tempos modernos, tem
por força motriz a desobediência. Mas desobediência qualificada por um novo
aspecto, pois quem promove agora a subversão é a própria autoridade, como que
pressionada por um inevitável impulso suicida.
Os
pais pelas atitudes de fraqueza, educam os filhos para a desobediência. Os
governos tolerantes de um Frei, no Chile, de militares fracos, na Argentina,
levaram essas duas nações à desordem total. Pela tática renúncia dos
governantes ao poder, muitas outras nações caíram nas mãos da desordem
organizada dos regimes marxistas. Quem entre os católicos fala oficialmente
pregando a revolta do filho ao pai, do povo ao governo, não são os fiéis, são
os próprios membros do corpo docente consagrados para ensinarem aos homens a
piedade, a paciência, a submissão e a paz.
O
processo revolucionário dirigido pelo “pai da mentira” contra o Pai Eterno só
poderá ser detido pela contra revolução dos filhos de Deus que contemplam no
superior a imagem do Pai. A mais terrível arma do “filho das trevas” contra o
Pai das Luzes é ter conseguido arrancar dos corações o sentimento de piedade,
de respeito e de amor aos pais. As palavras de S. Paulo dirigidas para a
comunidade familiar, onde a ordem social encontra a sua fonte, poderão, com as
devidas transposições, ser aplicadas a todas as esferas da sociedade dos
homens. “Filhos, obedecei os vossos pais no Senhor, porque isso é justo. Pais,
não exaspereis vossos filhos, mas educai-os na disciplina e na correção
conforme o Senhor”. (Ef., 6. 1;4).
Fonte: Editorial
da Revista Permanência, no. 57, Julho de 1973
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